quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Acolhendo as diferenças

Fernanda Breda e Matheus Dalla Costa*

Procedente da mobilização de uma diplomata norte-americana, mãe de uma de uma portadora de Síndrome de Down, um grupo de pais, professores e médicos reuniu-se em prol do assistencialismo, fundando a primeira Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais, em 1954. De lá para cá, a APAE coleciona décadas prestando suporte social e didático a quem necessita, e uma vasta rede de instituições filiadas por todo o território brasileiro.

                    Foto:Fernanda Breda
Trabalhando há 21 anos na APAE de Erechim, que também atende a vários municípios menores da região, Romi Marta Niederberger, atual diretora da Escola de Educação Especial Branca de Neve, começou na escola como professora. Desde então, vem acompanhando e oferecendo auxílio a pessoas com necessidades especiais, e nos conta um pouco sobre a organização.

ComArte: Qual a deficiência tratada na APAE, e quantas são as pessoas envolvidas nesta instituição?

Romi Marta Niederberger: A APAE é uma entidade filantrópica para pessoas com deficiência intelectual moderada. De 0 à 57 anos, que é a idade do nosso aluno mais velho. Temos 208 alunos e 53 funcionários, entre eles, nutricionistas, cozinheiros, serventes, operadores de telemarketing e assistentes administrativos.

ComArte: Os alunos frequentam a APAE em tempo integral?

Romi: Nós temos 30 estudantes que estudam em turno integral. Eles ficam até a hora do almoço estudando, e à tarde participam de oficinas de dança gaúcha, teatro, capoeira, atletismo e esportes, fechando os 5 dias úteis da semana. 

 ComArte: Os outros alunos, participam de escolas tradicionais no turno livre?

Romi: Não mais, apenas alguns alunos do interior frequentam também outras escolas. Agora dispomos das salas multifuncionais, então eles têm toda a estrutura aqui dentro. Alguns de nossos estudantes também trabalham. Dez dos nossos alunos estão inseridos no mercado de trabalho. Eles passam meio dia na escola, e outra metade do dia no emprego. 

ComArte: Como é a aceitação deles no mercado de trabalho?

Romi: Eles gostam muito de trabalhar, se sentem realizados, se tornam independentes, mais críticos e evoluem bastante. Na questão da aceitação, as empresas em que temos nossos estudantes trabalhando estão muito felizes com eles, pois conseguem se relacionar e se desenvolver bem.

ComArte: No quê eles geralmente trabalham?

Romi: Isso depende do que a empresa oferece. Nós temos estudantes trabalhando no Master Shopping, na reposição de mercadorias da Pittol, na reciclagem de papel na Indústria Ouro Verde, na Comil, temos um estudante que fez o curso do SENAI e aprendeu a fazer a solda Multi-mic. Ele não sabe ler nem escrever, mas desenvolve um trabalho bastante difícil. 

ComArte: Percebemos que há um consultório odontológico aqui na APAE. Vocês também oferecem assistência médica?

Romi: Nós temos um consultório, porém, como é serviço voluntário, contamos com apenas uma profissional na quarta-feira de manhã. Como não temos contrato com o dentista, dependemos da disponibilidade do mesmo. 

ComArte: A APAE possui algum suporte financeiro?

Romi: A APAE tem convênios com o Governo do Estado, o Governo Municipal e recebe essa ajuda através da acedência de professores com o governo municipal. Então, temos acedência de professores e o transporte, que também é gratuito na entidade. E a colaboração da sociedade como um todo, através do telemarketing, débito em conta e doações.

Alunos da APAE Erechim em visita ao Estádio Olímpico no dia 10 de julho (Foto: grêmio.net)

ComArte: Você acha que as escolas convencionais têm capacidade de receber alunos com necessidades especiais?

Romi: Nós não somos contra a inclusão, muito pelo contrário. Somos a favor, tanto que incluímos nossos alunos em todas as atividades possíveis de serem feitas fora da escola. Fazemos visitas, como na última semana, quando fomos a Passo Fundo visitar o zoológico e a APAE de lá. Participamos de todas as atividades realizadas pelo município quando somos convidados. O que nos preocupa na inclusão, é a aceitação das diferenças, porque a sociedade, como um todo, ainda não está preparada para conviver com o “diferente”. A nossa preocupação é que ele fique de lado nessas escolas e que não possa ter o convívio de lado. Aqui, eles convivem uns com os outros, independente da idade ou tamanho. Se um é deficiente físico, e outro intelectual, eles não vêem essa diferença. Eles se respeitam, gostam um ao outro, e se aceitam assim. 

ComArte: E na questão da aprendizagem?

Romi: O deficiente intelectual tem mais dificuldade no desenvolvimento da leitura e escrita. Então, é difícil, mas nós trabalhamos com todos os níveis, insistindo na alfabetização, que percebemos ser mais difícil do que o convívio social e a aprendizagem de tarefas diárias de socialização, independência e preparação para o mercado de trabalho. Nosso objetivo final é colocá-los no mercado de trabalho. 

ComArte: Qual é o maior aprendizado obtido nesse convívio diário com os alunos?

Romi: O que chama atenção em nossos estudantes é que eles não costumam valorizar as pessoas pelo que elas têm. Eles valorizam quem as pessoas são. Eles fazem de tudo para serem bem-quistos e aceitos. Isso nos dá uma lição de vida muito importantes.

*Fernanda Breda e Matheus Dalla Costa são acadêmicos do VI nível do curso de Comunicação Social Habilitação em Jornalismo da UPF.

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