sexta-feira, 10 de junho de 2011

À espera de um milagre

* Francine Tiecher


Não é novidade para as pessoas que o sistema de saúde no Brasil enfrenta dificuldades e passa por sérios problemas de estrutura, descaso por parte dos governos e problemas com verbas para manutenção de espaços. Quem precisa e depende da saúde pública no país enfrenta uma situação crítica. Muitos hospitais estão prontos, mas ainda permanecem inativos. Já os postos de saúde enfrentam superlotação e longas filas de espera para atendimentos. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), tendo como base a qualidade da saúde pública oferecida aos seus cidadãos, o Brasil está no 125º lugar no ranking mundial entre 191 países. Nessa lista, o país perde até para a Bósnia e Líbano, e se iguala ao Egito.

Na edição sobre saúde pública da ComArte, o Dr. Alberi Grando, médico sanitarista, ex-secretário municipal da saúde e coordenador da 6ª Coordenadoria Regional da Saúde é questionado sobre algumas questões pertinentes à região norte do Estado. 
 
 

Dr. Alberi Grando

Revista ComArte: Como está o panorama geral do setor da saúde no município?

Alberi Grando: O setor de saúde no município de Passo Fundo não difere dos demais municípios pólo do Rio Grande do Sul: tem bons serviços, tanto públicos como privados, tanto ambulatorial como hospitalar. Isso faz com que pequenos municípios, que não têm a mesma qualidade de serviços, busquem aqui a solução de seus problemas. São centenas de pessoas que consultam, fazem exames e recebem medicamentos nas Unidades de Saúde do município. Os hospitais, todos muito bem equipados e em condições de resolução, recebem pacientes de todos os municípios da região e até de outros estados. Isso traz dividendos para o município, mas também traz problemas: o setor público encontra dificuldade de fazer planejamento de custos, pois não sabe qual a população que vai atender mensalmente.

RC: De que maneira foi resolvida a situação do Hospital Municipal, que estava correndo o risco de ser fechado? Que alternativas o município buscou para evitar o fechamento dessa unidade, onde principalmente os usuários do SUS buscam atendimento? E em relação ao Hospital São Vicente de Paulo, que está restringindo o atendimento da emergência adulta por superlotação? Existem medidas que podem ser tomadas para solucionar essa questão?

AG: O Hospital César Santos não pode e não vai fechar, pois presta um bom serviço e deve ser mantido em atividade. A situação se resolve com investimento financeiro, em torno de 100.000,00 a 120.000,00 mensais, pelo município, pois o que o SUS repassa é muito pouco para atender os custos. A alternativa é manter o que está funcionado bem e ampliar a clínica de atendimento de dependentes de drogas, que é uma necessidade e mostra uma tendência crescente. Mas é necessário investimento financeiro. Além disso, deve ali funcionar a base para o SAMUR e construir a UPA (Unidade de Pronto Atendimento). O Hospital São Vicente fecha temporariamente a emergência pelo acúmulo de pessoas que ali se socorrem. E por que? Porque as pessoas acham que seu problema precisa de exames especializados ou internação hospitalar. Tem trabalhos mostrando que mais de 70% dos pacientes que buscam as emergências não têm essa necessidade. O problema poderia ser resolvido na Unidade Básica de Saúde, perto de sua casa. Mas não podemos nem sequer criticar esses pacientes, eles sempre buscam o que acham que é melhor para si ou para seu familiar. Solução? Mais recursos, para se ampliar esse tipo de atendimento, como a proposta da UPAs, que são unidades intermediárias entre a Unidade Básica e o Hospital.
  
RC: Como está a situação da falta de médicos especialistas nos CAIS da cidade, já que muitas vezes a população precisa enfrentar grandes filas para marcar consultas, e ainda tem que aguardar um tempo considerável para atendimento? E em relação ao PAM e medicamentos? Como tem sido a distribuição da medicação de uso restrito (medicamentos de tarja preta, por exemplo)?

AG: A falta de médicos deve ser resolvida agora com o projeto da Seleção Pública Simplificada, que acabamos de aprovar na Câmara de Vereadores, do qual fomos um dos defensores lá no legislativo. O município pode contratar médicos para preencher as necessidades em cada CAIS. As filas sempre acontecem quando a oferta é menor que a procura. E nem sempre se pode oferecer exatamente aquilo que a demanda exige. A farmácia do PAM já há tempo existe um projeto para ser retirada do PAM (na Av. Presidente Vargas), que já não atende as necessidades. Mas a burocracia obriga tudo a andar muito lento, mas imagino que logo teremos uma farmácia mais adequada. Os medicamentos de tarja preta não apresentam problemas, basta que o médico receite em receituário apropriado.

  RC: Estamos no inverno e já passamos, em 2009, por uma epidemia da Gripe A (chamada também de Gripe Suína). Por que motivos algumas pessoas vêm se opondo à vacinação? Pode ser pelo fato dessas vacinas estarem apresentando fortes efeitos colaterais? E em relação à vacinação em geral, os números atingiram o resultado esperado? Quais outras campanhas de vacinação são esperadas para o restante do ano?

AG: Pessoas não buscaram a vacina da gripe A por se sentirem seguras que era uma doença que tinha passado. Mas isso não é real, e no momento que aparecerem mais casos, a procura vai intensificar. Não se identificou efeitos colaterais que justificassem suspender o uso dessa vacina. Aconteceram muitos boatos, sem confirmação científica, nem casos de morte pela vacina, em todo o mundo. De fato, não se atingiu a estimativa esperada, ficando abaixo de 80%. Outras campanhas, depende do que pode surgir e da avaliação da vigilância em saúde, que é quem cuida de prever o que pode acontecer em termos de epidemias.

  RC: No que diz respeito às drogas: no último dia 11 de maio, em reportagem veiculada no jornal O Nacional, o senhor Dr. Alberi Grando fez uma afirmação de que a questão do crack em Passo Fundo já se tornou assunto de saúde pública. Também foi apresentado na reportagem um dado alarmante: do início do ano até agora, o município já gastou mais de R$40.000,00 com usuários de crack. Qual é o posicionamento da coordenadoria em relação a esse assunto? E em relação ao Óxi, que é uma droga considerada nova, o senhor acredita que essa substância piore muito a situação da drogadição e dependência química em Passo Fundo? E como fica a situação do Hospital Municipal, em que foi cogitada a hipótese de ser transformado em um centro de tratamento de doentes e de dependentes químicos?

AG: A questão do crack em Passo Fundo, de novo, não difere dos demais municípios de médio e grande porte: é uma triste realidade, onde crianças, adolescentes e adultos se tornam dependentes de uma droga que não tem volta, causando uma doença irreversível e que ainda não se tem um tratamento adequado e eficaz. Em termos de medicamento, tratamos como se fosse um psicótico, um doente mental. Por isso, é um problema de saúde pública. Tanto que hoje, tanto o Ministério da Saúde como a Secretaria Estadual da Saúde estão apresentando programas para uma ação efetiva de combate a essa doença. Mas só seremos efetivos de fato se enfrentarmos os problemas considerando três vieses bem definidos: segurança, saúde e assistência social, cada um com suas ações, mas trabalhando em verdadeira interação e consonância. O Hospital Municipal não deve ser transformado em hospital de drogaditos, mas apenas ampliar a assistência que já é feita com crianças e adolescentes. Não deve fechar o que funciona bem. Quanto ao Óxi, sem dúvida que chegará em Passo Fundo, pois tem mercado, e esse comércio é muito bem organizado, além de detentor de poder financeiro.


RC: Para finalizar: previamente, está sendo feito algo em relação à epidemia que está acontecendo na Alemanha, onde a bactéria "E.Coli" está contaminando pessoas? Há o risco de ela se propagar em âmbito mundial? Se ela chegar até nós, de que maneira pode-se agir? Que medidas podem ser tomadas para se prevenir contra uma nova epidemia?


AG: Essa bactéria, Escherichia coli, que até é banal em infecções urinárias, resolveu fazer uma mutação e está infernizando a Alemanha e outros países nórdicos. Tem causado uma dita Síndrome Hemolítica Urêmica e a diarréia sanguinolenta, com 520 casos da Síndrome e 1.213 da diarréia, com 17 óbitos, até agora. O contágio, aparentemente, se fazia por vegetais crus e alimentos de origem animal, o que parece que não se confirma nos últimos estudos. Com certeza, o contágio também se faz de pessoa para pessoa. O tratamento se faz com hidratação e medidas de suporte e não usar antibiótico. Prevenções: não viajar para esses países, por enquanto. E cuidados exagerados em higiene, sempre!

 

*Aluna no VII nível de Jornalismo Online

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