sábado, 28 de novembro de 2009

Consciência através do berimbau

Verônica Faquin, acadêmica de jornalismo, VII nível


Maurício Antunes de Oliveira é professor de capoeira e vice-presidente do Movimento Étnico-cultural dos Negros de Erechim. Abaixo um pouco do que ele pensa sobre consciência negra.

O que representa o dia da consciência negra e qual o significado que este dia tem para você?
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A data do dia 20 de novembro, dia da Consciência Negra é uma homenagem ai dia do suposto falecimento de Zumbi dos Palmares. Para nós, brasileiros, a data da consciência negra é mais comemorada pelos negros do que o próprio dia 13 de maio que celebra a abolição da escravatura. O 20 de novembro tem um simbolismo bem maior, para nós [negros] trata da verdadeira libertação dos negros. Para mim é um momento de parar para pensar qual é o nosso lugar na sociedade, qual o nosso objetivo, qual a nossa real história, a nossa ancestralidade, o que é de real valor pra nós, a valorização da nossa própria cultura, a valorização da nossa própria história como negros e principalmente como brasileiros porque resgatando a história negra automaticamente você resgata a história do Brasil. É um momento que a gente procura a resgatar o negro que vive dentro de cada um, de cada brasileiro.

Quais ações que você realiza para que essa cultura permaneça e seja repassada para os outros?
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Bom, eu faço parte de duas associações, a ACANNE – Associação de Capoeira Angola Navio Negreiro, e a MENE – Movimento Étnico-cultural dos Negros de Erechim. A ACANNE visa o ensino da capoeira angola, que é capoeira raiz.
A capoeira angola procura manter viva a cultura afro-brasileira, a cultura africana, e despertar dentro de cada um o seu capoeirista interior, despertar dentro dele a própria negritude, essa visão africana voltada para um meio de vida diferente. Às vezes uma vida simples te traz mais luxo que uma vida cheia de luxo sem ter nada na verdade. Então é isso que a capoeira traz, ela sempre foi uma arma nas mãos das comunidades carentes, ela sempre esteve do lado do mais fraco. Esteve do lado escravos quando eles precisaram, está do lado dos pobres em muitos dos seus direitos, do lado dos homossexuais em busca dos seus direitos, do lado das mulheres contra o machismo e o sexismo, na verdade ela tem que ser livre de preconceitos. Então tudo isto a gente tenta resgatar, valorizar e transpassar, é uma forma de apresentar vários caminhos para que você possa escolher qual deles vai seguir. A ACANNE são várias mentes pensando diferente, mas todas com o mesmo objetivo, mesmos preceitos e fundamentos. Eu já sigo a linhagem da associação há aproximadamente 8 anos por exemplo.

E o MENE, como funciona?
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Na verdade, o MENE surgiu junto com um pensamento em conjunto com o pessoal da ACANNE pelo simples fato de que iria possibilitar um campo maior de trabalho, a gente estaria unindo mais pessoas que não estariam voltadas só pra capoeira mas unidas de outra forma. Na verdade você não precisa estar na roda pra jogar capoeira, você pode jogar capoeira lutando pelos direitos, pela cultura, e é isso que o MENE faz. Ele veio com o objetivo de resgate e valorização da historia e da cultura negra, tendo como um dos objetivos principais e já realizados o resgate da própria história do negro em Erechim, que até então era apagada, e negro não era uma etnia colonizadora do município. Após pesquisas e trabalhos que o MENE desenvolveu hoje é provado e comprovado que o negro foi uma das primeiras etnias a estar em Erechim, logo após os indígenas.

Você também desenvolve um projeto em outros municípios da região, não é?
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Sim, este é um projeto particular, mas fundamentado dentro dos segmentos da ACANNE. O nome do meu projeto é “Nossa Herança”, porque eu sempre tive essa visão do resgate da herança ancestral que nós temos. Nós temos que tomar partido da nossa herança, essa é nossa história, é nosso, e se a gente não valorizar o que é nosso não tem porque dos outros respeitarem e valorizarem. Eu dou aula em outros dois municípios que são Barão de Cotegipe e Campinas do Sul. Meu trabalho é todo em cima da capoeira e do despertar dessa matriz afro. Eu sei o quanto a capoeira me ajudou mostrando que se eu consegui vencer alguns objetivos na minha vida, então eu sei que se eu despertar essa mesma coisa nos meu alunos eles vão ter possibilidade de vencer na vida também e ser o que eles quiserem.

Como é desenvolvido o teu trabalho?
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Os projetos são acertados diretamente com a prefeitura, e já que todas as famílias pagam impostos, nada mais justo que esse dinheiro voltar para a sociedade em forma de trabalhos sociais, seja co a capoeira ou qualquer outro trabalho que venha a incentivar eles.
Eu dou aula para alunos pagantes e não pagantes, e estes são chamados de bolsistas – a bolsa de estudos da capoeira – o aluno pagante tem o seu direito de treinar, e faltar se precisa e tem o direito de aprender a capoeira, já os não pagantes tem um compromisso a mais, eles não pagam em dinheiro mas tem que contribuir de alguma forma. Então eles tem um compromisso comigo de ir bem na escola, eles me mostram boletim, me ajudam a organizar as atividade, limpam o espaço que nós usamos pra treinar. Então eles tem um compromisso com a capoeira, eles tem que viver aquilo. Porque afinal se tu não ta pagando ta ali porque quer aprender então tem que mostrar resultado, se dedicar, esforçar e obedecer principalmente, seguir umas regras a mais que os pagantes. Se eles não cumprirem com o compromisso quem está falhando é o educador.

Um pouco da história da capoeira...
História da capoeira
Capoeira regional é a sem camiseta. Jogam com calças largas representando as calças de ráfia que os negros usavam na época, usam uma corda na cintura simbolizando a corda que o nego amarrava pra não cair e pé descalço porque ele andava descalço. A capoeira regional usa o cordel como forma de graduação.

Capoeira angola – a roda de capoeira é um momento de liberdade, é expressão corporal é a liberdade do seu corpo, você tem que deixar seu corpo livre pra ele falar,, você dialoga com outra pessoas através do seu corpo, então é exatamente isso a liberdade de expressão, é o que você quer ser ali dentro, você faz o que quiser, então de acordo com essa história capoeira-liberdade a diferença do negro escravizado com o negro liberto é que o negro liberto tinha o direito de usar calçado. Antigamente fazia-se a roda de capoeira e depois da roda de capoeira angola existe o samba de roda, com berimbau, atabaque, pandeiro. Nesse momento as mulheres ficavam assistindo os homens jogar capoeira, entravam pro samba, e o cara que tava jogando capoeira ia tentar a sorte dele, ali que rolava tudo e até hoje ainda acontece. Então aquele momento era o auge, o negro liberto ele ia pra roda de capoeira tinha que pensa em joga bonito pra não apanha do outro e joga mais bonito ainda pra mulher que tava lá fora vê ele. Então ele vestia a domingueira dele e ia pra roda bonitinho e pretendia saí da roda de capoeira limpo, esse era considerado o bom capoeirista, aí ele tinha mais chance de ficar com a mulher depois. Então a capoeira tinha essa história, não visando o negro como escravo, mas como liberto.

Qual o seu objetivo com o trabalho que tu realizas?
O meu objetivo é deixar a minha herança pros meus alunos e a comunidade que me cerca. Esse é o compromisso que eu tenho comigo com a minha cultura, a cultura negra.

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